terça-feira, novembro 10, 2009

O PORTO DE PESCA DE PENICHE E A SUA EVOLUÇÃO AO LONGO DOS TEMPOS

Por: Fernando Engenheiro
Sempre que o homem, para seu beneficio próprio, pode alterar os bens que a natureza lhe proporciona molda-os à sua maneira, conforme as necessidades que sente.
E, porque a natureza dotou Peniche de excepcionais condições para o efeito, desde os tempos mais remotos aqui o homem criou um porto de pesca de grande actividade e até um importante centro de construções navais. Aqui se procedeu se procedeu a obras de construção de alguns cais acostáveis como, por exemplo, o "cais da banda de além junto à cruz” (citado no Livro de Vereações de 1629/1631, fls. 14 e 14v.), as obras no Portinho do Negrão - Obras de grande vulto na Doca ou Rio (L.º de Vereações 1731/1734, fls. 170v. a 172v.) - Grande reparação no Cais e Porto (Lº. de Vereações, fls. 107 a 110v., de 20/5/1746).
Hoje mal se sabe ao certo onde grande parte destas obras foram efectuadas.
O terramoto do fatídico dia 1 de Novembro de 1755 alterou bastante esta zona, transformando geograficamente uma grande parte do círculo abrangente do porto de abicagem e de abrigo.
Quando da erupção do mar que se verificou na ocasião do terramoto havia em Peniche mais de trinta e cinco embarcações de pescar e quatro iates, cujos donos negociavam comprando pescaria. Tratava-se de barcos de maior tonelagem que levavam peixe a vender a outras partes do Reino.
A erupção do mar deixou ficar somente duas embarcações de pescar capazes de irem ao mar. As outras embarcações de pescar que havia, umas se perderam inteiramente e outras ficaram naufragadas nas praias, incapazes de irem ao mar, sem grandes possibilidades de consertos. A dita erupção do mar foi causa da perda de muitos barcos, incluindo os quatro hiates que havia, bem como da ruína total dos portos dos embarques, por ficarem as praias lavadas e rasas.
Também na mesma catástrofe encontraram a morte, engolidos pelas águas, 50 habitantes desta então Vila de Peniche que, vendo o mar encapelado e aproximar-se da terra uma enorme onda, começaram a fugir pelas praias e foram arrastados pelo mar.
Pouco tempo depois de tudo passar, houve que contabilizar os prejuízos e proceder às necessárias reparações de modo a que os homem do mar voltassem à sua vida normal.
Pelo Rei D. José I foi concedido que fosse retirado do cofre desta então Vila de Peniche, dos sobejos das sisas e bens de raiz, oitocentos mil réis para conserto do cais e ponte, bem como para a abertura do chamado “Rio” (que hoje conhecemos como “Doca”) que, pelo grande assoreamento em que se encontrava, não permitia que entrasse ou saísse qualquer embarcação (L.º de Vereações de l759/l762, fls. 132 a 134).
O Portinho de Revez era uma pequena caldeira natural com entrada voltada a SE. que, apesar de ficar quase toda em seco na baixa-mar, prestava, contudo, grande serviço aos barcos de pesca que ali varavam e ficavam ao abrigo do mar e do vento pelas restingas que a contornavam pelo lado exterior. Tornava-se um pouco mais perigoso com os ventos do Sul que levavam ali grande ressaca.
Tinha esta enseada grande necessidade de obras.
Longos anos se passaram sem que ali fossem realizadas quaisquer obras de conservação ou efectuadas alterações com o aproveitamento das rochas que a circundavam e que lhe davam a forma de porto de abrigo.
No livro de Vereações de 1837/1843 consta que o vereador Joaquim Marcelo Machado chamou a atenção da Câmara Municipal para a utilidade que resultaria para a classe marítima da Vila de Peniche se se fizesse uma Estação no Portinho de Revez onde as embarcações pudessem estar em segurança. Para isso bastaria tapar convenientemente com muralha todas as aberturas por onde o mar entrava naquele Portinho, afora a que dá entrada às embarcações. Para se fazer aquela obra ele mesmo se oferecia a fazer diligência por alcançar a soma necessária para cobrir todas as despesas inerentes ao exposto. Nada se resolveu na altura, o que evitaria a perda de 12 embarcações de pesca aquando do grande temporal ocorrido em 1868.
Mesmo assim ainda o Ministério da Marinha solicitou, depois de novo temporal em 1870, remédio aquele mal, não constando que esta solicitação fosse atendida.
Este desejo de toda a classe ligada ao mar só foi alcançado anos depois, com obra a cargo da antiga 3ª. Circunscrição Hidráulica, por projecto de 20 de Maio de 1889, que constava da quebra e extracção de muitas pedras, que constituíam perigo para as embarcações, e com essas mesmas pedras arrancadas se formou um molhe de pedra seca, apoiado nas restingas naturais, para completar o abrigo do lado do mar da pequena bacia.
Ficou assim com o coroamento 1 metro superior ao preamar de águas vivas tendo interiormente uma pequena banqueta para o serviço da doca e sendo para o exterior em talude.
Custou esta obra 2500$000 réis, estando incluída no mesmo projecto a despesa com uma rampa no lugar da antiga escada que dava para a rua do Cais (actual Avenida do Mar) para servir o lugar onde os barcos estacionavam ao abrigo de um molhe que corre paralelo àquela rua.
Longos anos se passaram em que as despesas se limitavam ao levantamento de cascos de barcos naufragados, de tonelagens das mais diversas, que prejudicavam os ancoradouros bem como os canais de navegação.
Era, portanto, muito pouco o que até ali se tinha feito para uma localidade que, se não podia considerar-se como um importante porto de comércio, era importante para a industria da pesca e que interessava muito à navegação geral da costa, pelo abrigo que podia dar-lhe quando fosse acossada por temporais.
Por várias vezes foram feitos pedidos pelas chamadas forças vivas desta terra, pelas Comissões Administrativas, a governadores civis, a ministros e a outras entidades do Governo. Visitas não faltavam mas nada se concretizava, a despeito da boa vontade de todos que bem prometiam diligenciar para que em Peniche se construísse um Porto de Abrigo com a maior urgência possível, pelo grande movimento marítimo que possuía.
Já com a entrada do chamado "Estado Novo" novamente o Município de Peniche apresenta as suas reivindicações quanto à questão do Porto de Pesca, enviando-se ao Poder Central o pedido para que o Governo, pela pasta do Comércio, faça inscrever no próximo orçamento ordinário do Estado, que se seguia ao ano de 1931, a verba para tal fim já orçamentada em escudos 2.316.550$00.

Sem comentários: